Qual é o problema?

Eu ainda me lambuzo comento sorvete e qualquer coisa que envolva coisas semi líquidas. Ainda fantasio antes de dormir sobre contos de fadas e monstros e dragões, ainda sonho em salvar o mundo feito o capitão planeta. Ainda assisto Cavaleiros do Zodíaco e Caverna do Dragão e sonho com o príncipe encantado (que acredito já ter encontrado). Escrevo cartinhas para os amigos dizendo o quão especiais eles são, canto com os Backstreet Boys e as Spice Girls todas as músicas de sucesso. Tenho um certo medo de escuro e sonho com os monstros dos filmes de terror. Até hoje não consigo enxergar a lua minguante, tudo que vejo é o sorriso branco e brilhante do gato de Alice no país das maravilhas. Sonho com livros e torço pelos heróis das fantasias. Canto no chuveiro como se ninguém estivesse ouvindo e converso sozinha no meu quarto. Ainda choro assistindo os desenhos da Disney e qualquer outra coisa que seja um mínimo bonitinha. Tenho caderno de bichinhos e adoro canetas coloridas. Brinco de esconde-esconde e pega-pega no trabalho. Saio com os meus amigos numa quarta feira para jogar bets na Unicamp. Adoro desenhos animados. Gosto de pintar com lápis de cor, giz de cera e canetinha colorida. Até hoje me vejo no espelho como uma criança que cresceu (bem pouco). Ainda sou capaz de entalar no caiaque e dar risada como se fosse a coisa mais divertida que já me aconteceu. Invento histórias na minha cabeça de como tudo ia ser perfeito. Brinco de fazer cosquinhas e de derrubar meu namorado do sofá. Adoro guerra de bexiga d'água e jogar futebol de brincadeira. Amo contos de fadas e livros de fantasias infantis e qual é o grande problema com tudo isso?
Nada disso me impede de ter um relacionamento de 4 anos e meio, de fazer Ciências Sociais na Unicamp e me sentir constantemente mal pelo desastre que o mundo se encontra. Não me impede de ter conversas cultas sobre a origem do universo às 4 horas da manhã, nem de ajudar um amigo que precise de um ombro e uma pessoa que saiba escutar. Não me impede de amar Jane Austen, Dostoiévski e Shakespeare. Não me impede de amar os filmes do Tarantino e os dramas com histórias complexas. Consigo ler notícias sobre política, ciência e atualidades. Leio Marx, Weber, Durkheim, Nietzsche, Gramsci, Hanna Arendt. Assisto filmes "pesados" e de conteúdo reflexivo. Faço ligações entre shakespeare e Aristóteles nas aulas. Sou responsável para trabalhar cuidando da educação de crianças. Nada disso me impede de ser tão adulta quanto todos os outros. A única diferença é que a minha parte criança não morreu e espero sinceramente que nunca o faça.

"When I became a man I put away childish things, including the fear of childishness and the desire to be very grown up"
C. S. Lewis

Vamos parar o tempo?

Ela parecia um gira-gira descontrolado de tão confusa. A cada segundo sentia algo diferente. Ficava feliz por alguém, triste por outro alguém, queria sair correndo e não tinha vontade de se levantar da cama, tinha uma imensa vontade de aprender e uma preguiça maior ainda de ler tudo o que devia estar lendo. Se estava empolgada em um segundo, no seguinte era praticamente uma tartaruga.
Sentia falta dos amigos, acima de qualquer coisa. Queria o cafuné de um, os abraços de outro, as piadas de um terceiro, a massagem de outro, a conversa de meninas com uma das poucas que eram suas amigas. Queria todos juntos no mesmo condomínio de casas se vendo todos os dias. Queria mais festas do pijama com sessão pipoca/sorvete e queria passar mal de tanto comer de novo. Queria mais macarrão ao molho branco, mais risadas, mais barulho e mais vídeos no youtube sobre o Hitler e o vestibular.
Ela queria destruir todos os relógios do universo, parar o tempo naquele instante, com todos eles em volta e só ficar ali, para sempre.